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Date :  2003-05-12
langue :  Portugais
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Fórum Mundial da água (Kyoto, 2003)

FMA


Atualmente, 1,2 bilhão de pessoas não têm acesso a uma água potável sadia; 2,4 bilhões não têm nenhum saneamento básico. Ao subscreverem os Objetivos do Milenário, os Estados membros das Nações Unidas comprometeram-se em reduzir esta proporção pela metade, até 2015.
Aproximadamente 24.000 participantes, 182 países representados, 351 sessões de trabalho, 38 temas abordados. Mas o 3° Fórum mundial da água foi encerrado, no domingo 23 de março, com um balanço magro. A declaração adotada por 96 países afirma que tudo deve ser feito para preservar e controlar o abastecimento de água no Planeta, mas anuncia muito poucos projetos concretos para alcançar este objetivo. O relógio da casa dos cidadãos continuou desesperadamente parado em 1.220.000.000 - o número de pessoas que não tem acesso a água potável.

O estatuto da água

Uma contribuição importante de Kyoto terá sido provavelmente o relatório "Financiar a água para todos" do grupo Camdessus. A qualidade do presidente, ex-diretor do Fundo Monetário Internacional (FMI), está provavelmente na origem da reação de muitas ONG que rejeitaram o trabalho de antemão, temendo o controle do setor privado sobre a água. Paradoxalmente, um grande número de governos e de instituições internacionais correm o risco de se opor ao relatório, que preconiza importantes mudanças de comportamentos. Uma contrariedade que combina com a necessária descentralização do financiamento das políticas da água. A crítica das ONG focaliza-se sobre o conceito de PPP - parceria pública privada, conceito surgido claramente em La Haye (março de 2000), "oficializado" por ocasião da Conferência ministerial de Bonn (dezembro de 2001) e fortemente divulgado em Joanesburgo (apelidada de "Cúpula das Parcerias").
As PPP "impõem tornar a água mais atraente aos olhos dos investidores; eles precisam de um cenário regulamentar e jurídico adaptado, de modalidades contratuais transparentes, de mecanismos de recuperação dos custos baixos e da aceitação do público em geral" (relatório Camdessus). Os opositores estimam que as PPP servirão apenas para abrir novos mercados aos investimentos privados. Efetivamente, foi por meio desse tipo de mecanismos que o Banco Mundial e o FMI facilitaram que as multinacionais assumissem o controle da maioria dos recursos naturais da África, da América Latina ou da Ásia. Afinal de contas, as PPP favoreceriam principalmente a mercadologização dos bens e serviços.
Estamos com isto no centro da polêmica causada pelo Acordo Geral sobre o Comércio dos Serviços (GATS em inglês). Muitas ONG pedem que a água seja excluída dele. Nesta altura do debate, o que está em jogo ainda é mal identificado pela maioria dos atores e pelo grande público. O mesmo não acontece com as grandes potências; assim, os Estados Unidos deram início a um recenceamento dos recursos andinos, visando uma eventual transferência maciça de água (1). A partir de agora, as tecnologias são operacionais, como demonstra o programa do Grande Rio Artificial na Líbia (2). Que se trate de avaliar reservas, de explorar mananciais ou de transferir a água por longas distâncias, as tecnologias requerem apenas seu aperfeiçoamento para serem rentáveis. Entretanto, o público em geral não compartilha a fascinação dos engenheiros e as estratégias a esse respeito: não haveria aí alguma coisa de fundamentalmente "ante-natural"? Como fica o direito à água?

Sobre os "direitos humanos"

Mais uma vez, Kyoto foi muito decepcionante. Os ministros recusaram conceder à água o estatuto de "direito humano". Entretanto, vários textos internacionais reconheceram a água como um dos direitos fundamentais e imprescritíveis da pessoa: a Declaração universal dos direitos humanos, de 1948, o Pacto internacional relativo aos direitos econômicos, sociais e culturais (PIDESC), assinado em 1966, ou, mais recentemente - e desta vez de modo perfeitamente explícito - a Declaração de 4 de dezembro de 2002, do Comitê dos direitos econômicos, sociais e culturais das Nações Unidas. Então, por que os governos continuam a recusar essa revindicação? É claro que as reivindicações decorrentes do direito à água colocariam obrigatoriamente alguns governos em dificuldade, principalmente nos países mais pobres e mais ameaçados. Mas essa obstinação em opor-se ao "existente" jurídico internacional é algo um pouco anacrônico.
O que reclamam, diante disto, os "World Water Warriors"? Inicialmente, a exclusão da água das negociações da OMC/AGCS (não à "mercadologização da vida"); mas também a criação de uma Autoridade mundial da água, democrática e representativa, reunindo as três competências: legislativa (um Parlamento mundial da água, encarregado de elaborar e de aprovar as regras básicas para uma valorização e uma utilização solidárias e duráveis do bem água); jurisdicional (um Tribunal mundial) e de controle (uma Agência de avaliação e de acompanhamento dos financiamentos públicos para projetos de ações comuns).
Saudamos a iniciativa da Unesco visando a promover, desenvolver e apoiar a criação de uma estrutura independente que facilite a resolução das dificuldades ligadas à gestão das águas transfronteiriças - e não se trata de uma autoridade supranacional de gestão das águas transfronteiriças. Por outro lado, as organizações internacionais e os organismos de pesquisa comprometeram-se a trabalhar por uma melhor compreensão do conceito de água virtual como meio de promover a proteção da água e de integrá-la às políticas nacionais e regionais (a água virtual é a água importada pelo viés das compras de produtos alimentares no exterior; de acordo com J. A. Allan, desde o final dos anos 1980, o Oriente Médio e a África do Norte importaram 40 milhões de toneladas de cereais e de farinha por ano, o que corresponde, em termos de água virtual, a mais da metade da quantidade de água do Nilo utilizada para a agricultura em todo o Egito) (3).

Sobre a solidariedade

Infelizmente, a solidariedade internacional também pode ser virtual. A água representa menos de 10% da ajuda pública ao desenvolvimento, ou seja, aproximadamente 4,5 bilhões de dólares por ano para o fornecimento e o saneamento. "As avaliações recentes das despesas necessárias para satisfazer os objetivos adaptados em Joanesburgo em matéria de água, implicariam, no mínimo, em aumentar os investimentos de pelo menos 50% a mais do que o esforço atual, ou seja, em dobrar esses investimentos", explica Henri Smets, da Academia da água. "Uma aceleração dessas só é concebível se a água ganhar uma prioridade governamental maior nos países em desenvolvimento, e se a ajuda internacional para a água aumentar de modo bastante sensível."
Em termos absolutos, os investimentos necessários foram avaliados em 180 bilhões de dólares por ano, durante dez anos (relatório Camdessus), ou seja, 100 bilhões de dólares a mais por ano (4). E 100 bilhões de dólares por ano, durante dez anos, corresponde... exatamente ao montante das despesas militares anuais mundiais.


Notas:

(1) Conforme o artigo de Marie Mazalto, "Les États-Unis en soif de connaissances", h2o - décembre 2002 – Dossier Amérique Latine.
(2) Conforme a reportagem de H2O na Líbia, publicada por Libération em sua edição de 22-23 de março de 2003. www.h2o.net
(3) Allan J.A., "L'eau virtuelle dans tous ses états", Le Courrier de l'Unesco, fevereiro de 1999.
(4) Um montante bastante super-estimado, de acordo com alguns especialistas das Nações Unidas que avaliam, por sua vez, a necessidade de financiamento em 11 bilhões de dólares por ano, durante 10 anos.




(Outros artigos sobre esta mesma problemática e redigidos pelo mesmo autor estão disponíveis em francês neste site: L’eau : entre défis et stratégies)


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