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Date :  2018-06-11
Language :  Portuguese
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Nutrir as Cidades com a Natureza

Escrito por Carlo Ratti

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BOSTON – Desde que o antigo poeta grego Teócrito escreveu os seus idílios pastorais a romantizar a vida rural, as pessoas têm ponderado sobre como construir cidades que estejam em harmonia com o seu meio natural. Contudo, com o crescimento exponencial das taxas de urbanização em todo o mundo, a necessidade de cidades mais verdes nunca foi tão premente com agora. Felizmente, a inovação e a tecnologia podem ajudar a alcançar este equilíbrio.

Os urbanistas têm concentrado o seu trabalho em colmatar o fosso existente entre as zonas urbanas e as zonas rurais. No século XIX e no início do século XX, as cidades europeias registaram um crescimento sem precedentes em consequência do êxodo rural para as metrópoles em recente expansão. À medida que estas cidades foram crescendo, foram ficando superlotadas e poluídas, o que inspirou uma nova geração de pensadores na busca de soluções.

Um destes visionários foi o britânico Ebenezer Howard que, em 1898, criou o termo "cidades-jardim" – que definiu como comunidades residenciais construídas em torno de uma combinação de espaços abertos, parques, fábricas e explorações agrícolas. Em breve, Londres foi cercada por subúrbios verdejantes concebidos com o objectivo de manter em equilíbrio a habitação de alta qualidade e o espaço verde abundante. O mantra de Howard era trazer a cidade para a natureza.

Algumas décadas mais tarde, do outro lado do Atlântico, Frank Lloyd Wright idealizou a Broadacre City, um projecto suburbano destinado a equilibrar o ambiente construído com o ambiente natural. Além disso, na Europa, Charles-Édouard Jeanneret, um arquitecto e urbanista conhecido como Le Corbusier, esboçava as visões das cidades utópicas que envolviam harmoniosamente o mundo natural.

No entanto, apesar de cada uma destas ideias ter sido revolucionária para a época, nenhuma teve êxito porque dependiam fortemente do automóvel e promoviam a expansão urbana. Na verdade, as urbanizações mais antigas do Ocidente caracterizavam-se por padrões de desenvolvimento que colidiam com a natureza, na medida em que não estavam interligadas por parques e espaços verdes mas sim por intermináveis faixas de pavimento impenetrável. Quando os urbanistas reconheceram as deficiências das soluções do século XX, procuraram inverter a equação: como é que a natureza pode ser devolvida à cidade?

O parque suspenso de High Line na cidade de Nova Iorque, um corredor verde aéreo construído a partir de um trilho ferroviário convertido que foi inaugurado em Junho de 2009, foi um dos primeiros projectos destinados a alcançar esta nova ambição no domínio do planeamento urbano. Desde o (já extinto) Garden Bridge de Londres até ao Skygarden de Seul, estão a ser concebidos projectos cujo objectivo é incorporar melhor a natureza no tecido urbano.

Os Jardins da Baía de Singapura são um exemplo dos esforços mais ambiciosos neste domínio. No parque Supertree Grove as células fotovoltaicas absorvem a energia do sol e a água da chuva é armazenada nas "copas" das árvores de aço para alimentar as torres de folhagem verticais. O ar desumidificado é recolhido para ajudar a arrefecer os edifícios adjacentes.

Simultaneamente, na Alemanha, a start-up Green City Solutions está a construir muros cobertos de musgo para limpar o ar poluído e ajudar a reduzir as temperaturas urbanas. O conceito de CityTree da empresa – essencialmente um sistema de filtragem natural – está a ser testado desde a Cidade do México até Milão.

Estamos, inclusivamente, a assistir a uma expansão na agricultura urbana, na medida em que os avanços na produção hidropónica e nas técnicas de cultivo aeropónico facilitam o cultivo de vegetais em espaços confinados. Sendo certo que as cidades nunca irão substituir as zonas rurais como a principal fonte mundial de produtos alimentares, uma percentagem mais elevada de alimentos pode ser cultivada em áreas urbanas. Novos empreendimentos como a Freight Farms em Boston e a InFarm em Berlim já estão a aproveitar estas tecnologias para fazer chegar a agricultura urbana a mais pessoas.

À medida que soluções inovadoras como estas se enraízam, os urbanistas voltam a sua atenção para empreendimentos ainda mais arrojados. Um conceito que tenho explorado com os meus colegas são os climas e os ecossistemas urbanos personalizados. Em Milão, mostrámos recentemente a nossa exposição Living Nature, um pavilhão de 500 metros quadrados, capaz de recriar as quatro estações simultaneamente sob o mesmo tecto. O objectivo do projecto era suscitar o debate sobre o planeamento sustentável e ilustrar as formas surpreendentes pelas quais a natureza será integrada nas cidades e nas casas do futuro.

Há mais de um século, o geógrafo francês Élisée Reclus previu astutamente que as pessoas iriam necessitar sempre "da possibilidade de ter acesso às delícias da cidade... e, simultaneamente, à liberdade que é sustentada pela natureza." O ideal de Reclus era visionário, mas prematuro. Contudo, actualmente, graças às novas tecnologias e ao pensamento arrojado, o fosso entre o meio urbano e o meio rural no planeamento urbano está a ser lentamente colmatado.


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