Há um trilhão de razões para se interessar em saber quem detém a dívida dos mercados emergentes. Foi essa a quantia despendida pelos investidores globais nesses títulos públicos nos últimos anos — US$ 1 trilhão. Saber quem são os detentores, por quanto tempo e porque isso varia ao longo do tempo pode lançar alguma luz sobre os riscos; uma inversão súbita do fluxo de recursos para fora de um país pode causar problemas. Alterações na base de investidores também podem ter implicações para os custos de captação de um governo.
Qual será o próximo passo dos investidores é uma pergunta importante para os mercados emergentes, e nossa nova análise ajuda a eliminar algumas dúvidas sobre quem detém a dívida de seu país. Quanto mais você souber sobre seus investidores, melhor compreenderá os possíveis riscos e como enfrentá-los.
Alguns fatos
Compilamos estimativas comparáveis e padronizadas da base de investidores em títulos da dívida pública dos mercados emergentes, utilizando a abordagem que desenvolvemos em 2013 para acompanhar quem detém a dívida pública das economias avançadas.
Utilizamos dados de 24 países de mercados emergentes, os quais estão disponíveis para todos os interessados em novas investigações (Figura 1). Os dados abrangem o período de 2004 até junho de 2013.
Segundo nossas estimativas, meio trilhão de dólares em investimento estrangeiro foram destinados aos títulos públicos dos mercados emergentes, apenas entre 2010 e 2012, na sua maioria provenientes de instituições financeiras estrangeiras não bancárias (grandes investidores institucionais, fundos hedge, fundos soberanos). Esses investidores detinham cerca de US$ 800 bilhões da dívida — 80% do total — no fim de 2012.
Também calculamos que os bancos centrais estrangeiros detinham entre US$ 40 e US$ 80 bilhões da dívida, e seus haveres parecem estar concentrados em sete países: África do Sul, Brasil, China, Indonésia, Polônia, Malásia e México.
A razão desse dinheiro ter sido investido em economias de mercados emergentes ao longo da última década refere-se, em parte, aos avanços na gestão da dívida pública. Em especial, os mercados emergentes alongaram o perfil de vencimentos de sua dívida, diminuíram a emissão de dívida a taxa variável e reduziram a dívida em moeda estrangeira. Isso tornou o balanço do setor público mais resistente a choques de taxa de câmbio e de juros e baixou o risco do lado da oferta da dívida pública. Uma das consequências desse processo foi o forte aumento do interesse estrangeiro na dívida pública dos mercados emergentes nos últimos anos.
A ampliação da participação externa nos mercados de títulos da dívida pública dos países emergentes cria oportunidades e novos riscos, especialmente do lado da demanda. O aumento da participação externa nos mercados de dívida pública pode ajudar a reduzir os custos de captação e distribuir melhor os riscos entre os investidores, mas também pode elevar os riscos de financiamento externo para os países. Além disso, saber quem são os investidores nos diferentes países é essencial para compreender a dinâmica da demanda global de dívida pública. As alterações na alocação dos recursos dos investidores globais entre os países são importantes porque podem afetar muitos
países simultaneamente.
Antes, durante e depois da crise financeira global
Constatamos que os investidores estrangeiros faziam uma distinção entre as economias de mercado emergentes em três períodos diferentes — antes, durante e depois da crise financeira global. Antes da crise, exibiam uma diferenciação moderada entre países: entrada de fluxos em alguns casos e saída em outros. Como é usual, essa diferenciação tornou-se muito mais acentuada durante a crise. Todavia, no terceiro período (2010–12), constatamos que os fluxos estrangeiros passaram a ser quase sempre positivos e muito menos diferenciados (Figura 2).
Parte dos fluxos de entrada pode ser explicada pelos melhores fundamentos econômicos em uma série de mercados emergentes nesse período. Cinco mercados emergentes alcançaram ou recuperaram o grau de investimento em 2010–12: Colômbia, Indonésia, Letônia, Romênia e Uruguai. A maioria dos mercados emergentes saiu-se bem da crise, com a recuperação relativamente rápida de altas taxas de crescimento. Isso pode ter criado a expectativa de valorização cambial nos mercados emergentes, intensificando a demanda por parte dos investidores estrangeiros. Ao mesmo tempo, até países cuja notação de crédito piorou ou não melhorou nesse período continuaram a receber influxos em um cenário de taxas de juro próximas a zero nas economias avançadas.
Os mercados emergentes podem se preparar
No ano passado, montamos uma estrutura para examinar como possíveis interrupções súbitas no capital estrangeiro podem afetar os mercados de títulos da dívida pública. Em nossa nova análise, formulamos cenários alternativos para saber o que aconteceria em diferentes circunstâncias. Fizemos isso para avaliar o impacto de um choque, não para prever a probabilidade de choques.
Os cenários mostram que, para um dado nível de participação estrangeira nos mercados de títulos da dívida pública, países com as seguintes características seriam menos sensíveis aos riscos de financiamento externo:
-relação dívida/PIB mais baixa
-menor necessidade bruta de financiamento
-sistemas financeiros internos mais desenvolvidos
-maiores margens de liquidez como proteção contra choques externos.
Assim, os cenários ilustram a importância de alongar o vencimento da dívida pública, desenvolver uma base de investidores locais e manter margens de liquidez para mitigar os possíveis danos causados por uma saída súbita de recursos estrangeiros. Países que adotaram essas medidas de contenção, como México e Polônia, enfrentaram menos pressões sobre a rentabilidade dos títulos em meados de 2013, apesar de apresentarem maiores índices de detenção estrangeira da dívida pública.
Por todas essas razões, os mercados emergentes precisam acompanhar atentamente quem detém sua dívida e por quanto tempo. Precisam reforçar suas comunicações com a base de investidores para compreender as necessidades destes.
Compreender os benefícios e riscos da participação estrangeira nos mercados emergentes é fundamental. Haveria uma combinação ideal de investidores internos e externos? Para saber mais, não percam a continuação da análise na próxima edição do Global Financial Stability Report.