O representante especial da ONU para a área de negócios e direitos humanos, John Ruggie, esteve ontem no Parlamento Europeu, onde participou numa audição sobre o tema, organizada pela subcomissão dos Direitos Humanos. Em entrevista exclusiva, o Professor da Universidade de Harvard falou-nos da crise económica e do papel das empresas europeias que operam em países em desenvolvimento.
Qual será o impacto da crise económica em termos de responsabilidade empresarial e social?
> "Em termos imediatos verificou-se um corte geral, que também abrangeu as despesas relacionadas com a responsabilidade empresarial e social, apesar de não ter sido tão drástico quanto inicialmente previsto. Penso que, a longo prazo, a crise terá um efeito salutar nas relações entre os estados e os mercados. No que se refere às consequências a longo prazo, nomeadamente a revisão da legislação e regulamentação da actividade empresarial, será necessário reforçar a transparência e o controlo".
As empresas europeias que operam em países em desenvolvimento devem limitar-se a comercializar ou também devem providenciar serviços locais como a educação e os cuidados de saúde?
> "Não quero parecer o Milton Friedman, mas negócios são negócios, e a construção de hospitais não é uma competência dessas empresas, a menos que seja a sua área de actividade, o mesmo sucedendo com a educação. Estas empresas devem exercer a sua actividade no respeito pelos direitos humanos e outras questões de natureza social.
Se as empresas entenderem que devem fazer mais, nomeadamente no que se refere à prestação de serviços, prefiro sempre que o façam em parceria com as autoridades públicas, para que as estruturas sejam construídas e se mantenham sustentáveis.
De um modo geral, as empresas não ficam para sempre e um dos aspectos mais tristes da filantropia empresarial verifica-se quando viajamos pelo interior de determinados países e observamos os esqueletos de antigas escolas e postos de saúde, construídos por empresas, que ninguém preservou".
Qual deve ser o papel das empresas europeias que operam em países com uma história documentada de violações dos direitos humanos?
> "As empresas que operam em países onde os padrões de defesa dos direitos humanos não são postos em prática têm de se confrontar com este dilema e lidar com o mesmo de forma cuidadosa.
O pior que poderia acontecer seria tornarem-se cúmplices de actos praticados pelo governo local contra determinados direitos humanos. Nesse sentido, devem agir com muita diligência, para se certificarem de que não são envolvidos em actos dessa natureza.
Estas empresas podem contribuir de forma extremamente positiva, como é o exemplo da liberdade de associação. Apesar de isso não ser permitido em países como a China, muitas empresas autorizaram a constituição de comissões de trabalhadores nas suas fábricas. O mesmo sucede quanto à igualdade dos géneros: muitas empresas ocidentais tentaram, pelo menos dentro da sua própria estrutura, apoiar tanto quanto possível o princípio da igualdade entre homens e mulheres".
- Para saber mais :
* Resolução do Parlamento Europeu, de 26 de Março de 2009, sobre a responsabilidade social das empresas subcontratantes nas cadeias de produção
* Parlamento Europeu sensível à responsabilidade social e ambiental do tecido empresarial
* John Ruggie